Por isso, robalos e sucata à parte, na edição de sexta-feira, o semanário SOL revela alguns conteúdos de um despacho judicial onde a transcrição de algumas escutas telefónicas em que intervém o primeiro-ministro indicia a suposta intenção de interferir no sector da comunicação social e afastar jornalistas incómodos.
O primeiro-ministro denuncia e acusa o jornal SOL de crime de violação do segredo de justiça, ao mesmo tempo que se insurge contra o que considera serem ataques à sua pessoa, mas também à justiça, ao PGR e ao STJ.
Terão sido boas e justas as decisões de arquivar o despacho do tribunal de Aveiro? Pese embora a consideração de “irrelevância criminal” deveria, ou deverá o Parlamento investigar as suspeitas? Porque não se ouve o PR falar sobre este assunto?
O director do semanário SOL, José António Saraiva diz em entrevista ao i que:
Já escrevia Alexis de Tocqueville em A Democracia na América (1835) que a influência de um poder é proporcionalmente aumentada à medida que é centralizado. Tocqueville comparava a dupla centralização da imprensa francesa da época (poucos órgãos de imprensa concentrados em poucos locais e em poucas mãos) com a imprensa dos Estados Unidos, onde o vasto número e disseminação geográfica, assim como a facilidade em editar um periódico, tornavam a liberdade de expressão algo que não era visto como uma ameaça permanente de revolução, dada a pluralidade de opiniões possíveis e a relativa incapacidade de inflamar as paixões do público.
A questão terá talvez um fundo filosófico... Montesquieu (O Espírito das Leis, 1803) não falava em separação de poderes num sentido estrito e até jurídico. A essência e condição fundamental da liberdade política é o equilíbrio dos poderes. Isto é, o sistema de checks and balances. Por outras palavras, os vários poderes (e incluiríamos aqui também o poder económico e o poder mediático) devem ter capacidade para coarctar os abusos de uns e de outros. E haverá sempre tendência para abusos. Onde e sempre que haja poder.
Se os media se tornaram uma das principais formas de controlo dos abusos de poder nas sociedades contemporâneas e a lógica do capitalismo tende a concentrar os recursos económicos e mediáticos em grandes monopólios, onde as relações com os governos nem sempre são claras, então, quis custodiet ipsos custodes?